40 mil Madeleines


O caso do desaparecimento de Madeleine McCann mobilizou o mundo. Celebridades do futebol, da literatura e até o Papa se envolveram na busca da garota de quatro anos que sumiu do quarto de um resort português no dia 3 de maio de 2007.
O caso Madeleine mobilizou, mais do que tudo, a imprensa. O caso virou novela nos jornais – não só nos diários britânicos, mas em todo canto do planeta. Mas nenhuma linha foi dita, por exemplo, sobre a adolescente angolana desaparecida no norte de Londres.
Também passam desapercebidos pela imprensa e pelo Papa – embora ocorram com uma freqüência assustadoramente maior – os casos de desaparecimentos de crianças no Brasil. Cerca de 40 mil ao ano somem sem deixar qualquer pista, segundo o governo brasileiro. Seja por desestruturação familiar, rapto, seqüestro, maus tratos, crianças e adolescentes brasileiros ou fogem ou são levados de suas casas sem que a mídia denuncie ou sem que suas famílias recebam apoio popular.
Em um país com mais de 180 milhões de habitantes, encontrar uma criança, que muitas vezes não sabe o nome ou telefone dos pais, é uma tarefa quase impossível. Para tentar contonar a situação, a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo criou a Rede Nacional de Identificação e Localização de Crianças Desaparecidas (Redesap). No site,as famílias podem incluir fotos e dados de menores desaparecidos.
Algumas vezes, os pais deixam de dar baixa nas delegacias quando as crianças são encontradas, por isso é difícil alcançar um número exato de quantas são as crianças e os adolescentes desaparecidos no Brasil. As estimativas variam de acordo com a fonte. Só a Associação Brasileira de Busca e Defesa a Crianças Desaparecidas, mais conhecida como Mães da Sé, tem um cadastro de 5 mil crianças que estão longe de suas famílias.
A Associação existe desde 1996. Foi criada por iniciativa de duas mães, Ivanise Esperidião da Silva e Vera Lúcia Gonçalves, que se conheceram quando estavam em um grupo de mães de crianças desaparecidas convidado a participar da gravação da novela Explode Coração, da TV Globo.
Na época, a novela mostrava a história de uma personagem cujo filho havia sumido. Decidida a encontrá-lo, ela resolve se juntar ao movimento Mães da Cinelândia, um grupo de mães que se reunia no bairro da Cinelândia, Rio de Janeiro, com fotos e cartazes de crianças desaparecidas, na esperança de que alguém que as visse pudesse dar alguma pista do paradeiro de seus filhos. Ao final da novela, 113 pessoas haviam sido encontradas, entre crianças, jovens e adultos.
Ivanise e Vera decidiram, então, criar em São Paulo um movimento semelhante, dando origem às Mães da Sé. Sempre aos segundos domingos de cada mês, elas se juntam na Praça da Sé (bem no centro da cidade) para repetir o gesto e a esperança das Mães da Cinelândia.
No Paraná, desde 1995, existe o Sicride, Serviço de Investigações de Crianças Desaparecidas. O órgão é subordinado à Polícia Civil e tem como função centralizar o registro e a apuração dos casos de crianças desaparecidas no estado. Um dos trabalhos mais interessantes desenvolvido pelo Sicride é o envelhecimento digital – recurso por meio do qual tenta-se recriar em computador a imagem que a pessoa teria atualmente através de fotos da criança e de parentes próximos.
Guilherme Caramês Tiburtius foi uma das primeiras crianças a ter sua foto envelhecida digitalmente para facilitar sua busca. O menino desapareceu em 17 de junho de 1991, aos 8 anos, em Curitiba. A família espalhou fotos do garoto por todo o país e seu rosto é um dos mais conhecidos entre as crianças desaparecidas no Brasil. Entretanto, até hoje, Guilherme nunca foi encontrado.
Outro caso que ficou famoso no Brasil, tanto pelo desaparecimento quanto pelo reencontro da criança, foi o de Pedro Braule Pinto. Seqüestrado da maternidade em 1986, com apenas algumas horas de vida, o menino foi criado em Goiânia, a 200 km de Brasília onde moram seus pais biológicos.
Pedrinho, como ficou conhecido, foi levado pela ex-empresária Vilma Martins e criado como seu filho legítimo até que, em outubro de 2002, a neta do suposto pai de Pedrinho desconfiou, após ouvir algumas conversas de Vilma, de que o menino não seria filho natural da empresária.
Após uma busca no site Missing Kids, ela constatou a semelhança entre Pedrinho e Jayro Tapajós, pai verdadeiro do menino. Feita a denúncia ao SOS Criança de Brasília, a Polícia Federal passou a investigar o caso.
Em novembro do mesmo ano, Pedrinho fez o teste de DNA que confirmaria sua identidade e daria início ao processo de reintegração à sua família e ao inquérito policial contra Vilma Martins, por seqüestro e falso registro.
Com a investigação do caso, descobriu-se ainda que outra suposta filha de Vilma também seria uma criança seqüestrada em 1979. Registrada como Roberta Jamilly Martins Borges, a jovem Aparecida Fernanda Ribeiro da Silva também foi levada da maternidade por Vilma Martins, 48 horas após seu nascimento. Esse caso chamou bastante e atenção da imprensa, mas nenhuma criança desaparecida virou novela como o caso Madeleine. Aliás, pouco é divulgado na imprensa do Brasil sobre casos de desaparecimento. Madeleine talvez seja hoje a criança em maior evidência na mídia brasileira.
Sejam casos famosos ou anônimos, para as famílias que têm um filho desaparecido, a vida segue com um buraco em suas histórias, deixado pela falta de alguém que nunca se sabe se voltará ou não.
A maior esperança destas famílias é que alguém, em qualquer lugar, possa dar alguma pista sobre seus filhos. Existem diversos sites de divulgação de pessoas desaparecidas, com fotos, dados pessoais, descrição das roupas que usavam na última vez em que foram vistas e o nome de familiares que buscam por elas. O caso Madeleine McCann nada mais é do que uma gota no oceano que virou uma tempestade midiática.






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1 comentários:

Luma Rosa disse...

Verônca, eu fico imaginando a angústia dos pais, sem saberem onde estão seus filhos, se estão sendo mal tratados. Deve ser a mesma dor de morrer em vida. Boa blogagem! Beijus

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